Vencedor do Jabuti fala sobre tradução premiada

19/10/2011

Marco Syrayama conta como foi traduzir “O livro de Dede Korkut” diretamente do turco

A base da cultura turca levou séculos para se formar e boa parte de sua construção está em seus contos. Uma das obras mais completas sobre a formação deste povo é “O livro de Dede Korkut”, coletânea de 18 narrativas originalmente pertencentes à tradição oral das tribos nômades que deram origem à Turquia. A façanha de transcrever a obra coube a Marco Syrayama de Pinto, especialista na língua oriental, que tornou esta coletânea a primeira tradução brasileira feita diretamente do turco para o português. Seu trabalho foi reconhecido em 2011 com o Jabuti, a principal premiação brasileira de literatura, que laureou “O livro de Dede Korkut” como a melhor tradução do ano. Confira abaixo os detalhes do trabalho na entrevista de Syrayama.

Globo Livros: Como aconteceu todo o processo de tradução do livro?

Marco Syrayama de Pinto: O Livro de Dede Korkut foi escolhido por várias razões: acesso aos manuscritos originais, existência de diversas edições em turco e traduções para outras línguas, além de vários estudos feitos por turcólogos ao longo de décadas, o que faz com que a tradução se torne o mais fidedigna possível. Trabalhoso foi o processo de pesquisa em torno da obra, buscar e ler artigos especializados em diversas línguas. Mas foi uma alegria ver uma obra tão rica e importante ser disponibilizada ao leitor brasileiro numa edição tão bem cuidada que, aliás, conta com os dois manuscritos disponíveis, o de Dresden e o do Vaticano.

GL: A cultura turca parece ser muito distante da brasileira. Em que características esses dois povos se aproximam?

MSP: De fato, historicamente há pouco entrelaçamento entre turcos e brasileiros. Houve uma breve visita de Dom Pedro II a Istambul em 1876 e, pouco antes, em 1858, havia sido assinado um tratado de Amizade, Comércio e Navegação entre o Brasil e o Império Otomano. Somente depois de 133 anos se deu a visita oficial de um estadista brasileiro à Turquia, na viagem do ex-presidente Lula. Em se tratando de personalidade, ambos os povos são hospitaleiros, gostam de conversar. Os turcos são bastante tradicionais, talvez mais que brasileiros, e há assuntos sensíveis ainda hoje para eles, tendo principalmente a ver com seu passado e religião. Mas, assim como os brasileiros, eles gostam muito de duas coisas: comer bem e dançar.

GL: Pode falar um pouco sobre as características da língua turca? Como a forma de escrever reflete a cultura de seu povo?

MSP: Por não compartilhar uma origem com as línguas indo-europeias, o turco possui uma estrutura bastante diferente das línguas que conhecemos. Alguns traços podem parecer fáceis para um brasileiro aprendendo o idioma, como a ausência de artigos definidos. Além disso, os substantivos não possuem gênero. A ordem dos elementos numa frase também pode causar estranhamento a um iniciante. Uma frase como “A Turquia possui inúmeros pontos de interesse turístico” seria algo, em turco, como “Turquia inúmeros turístico pontos possui”. E é patente o uso de termos de títulos honoríficos mesmo no dia-a-dia. Na Turquia, o não-uso dos “Sr.s” é que seria considerado estranho, e isso independentemente da idade da pessoa, quer seja homem ou mulher. Tal fenômeno, inclusive, pode ser uma pedra de tropeço na hora de traduzir do turco ao português.

GL: O que os contos reunidos no livro revelam sobre a forma de ser do povo turco hoje em dia, seus hábitos e valores?

MSP: Falam do espírito de bravura do povo turco, que persiste até hoje. Mas falam, especialmente, de um período intermediário, muito interessante do ponto de vista histórico, entre a conversão em massa dos turcos ao Islã (que se deu no século X) e seu modo de viver xamanista e pré-islâmico. O leitor do Dede Korkut pode refletir sobre o que os turcos daquela época bebiam, comiam, o papel decisivo de mulheres, mas também vários aspectos que perduram até nossos dias, como a importância do núcleo familiar para os turcos e sua religiosidade.

Fonte: Globo Livros
Texto: Drielle Sá

 

Saiba mais sobre  O Livro de Dede Korkut

A Turquia é a nossa mais íntima desconhecida. Sabemos mais de países do Extremo Oriente, como a China, o Japão, o Tibet, a Índia. E, no entanto, a Turquia tem um pé na Europa – é, assim, o mais próximo dos países asiáticos – e uma profunda presença na história ocidental. O Otelo de Shakespeare combate os turcos em Creta. Napoleão se bateu contra os turcos ao invadir o Egito. A primeira guerra moderna, a da Crimeia, opôs o Império Russo ao Império Otomano. Império Otomano que esteve no centro da Primeira Guerra Mundial, pois foi o esfacelamento de sua parte europeia, os Bálcãs, que gerou a instabilidade da qual ela se iniciou. O fim da Primeira Guerra, por sua vez, extinguiu o próprio Império Otomano e originou a atual Turquia, cujas instituições políticas, aliás, imitam as ocidentais. Mas o que sabemos, afinal, da Turquia? Sua localização entre a Europa e a Ásia, sua religião, o islã, sua condição de república laica, seu fundador Ataturk, Istambul, os sultões, os haréns. Mas o que sabemos, por exemplo, de coisas tão fundamentais como sua língua, sua literatura, seus hábitos, suas tradições, enfim, sua cultura? Não é exagero dizer que, de alguns pontos de vista bastante sólidos, a Turquia é, em relação ao Ocidente, o mais próximo e o mais relevante país asiático, e estranhamente, o mais distante de nossos corações e mentes. “O Livro de Dede Korkut” é um pequeno, porém significativo passo para mudar tal situação no Brasil. Pois se trata do mais importante poema épico em língua turca, traduzido diretamente por Marco Syrayama de Pinto, que também responde pelas notas e pelo detalhado prefácio. O livro tem 248 páginas e é um lançamento da Editora Globo.

Saiba mais sobre o Prêmio Jabuti 2011

A premiação foi transmitida em tempo real pelo Twitter da CBL (@CBL_oficial). A última etapa do prêmio acontece no dia 30 de novembro, durante a cerimônia de premiação dos vencedores, quando também serão conhecidos os Livro do Ano Ficção e Livro do Ano Não Ficção, prêmio máximo do Jabuti. Importante lembrar que a edição 2011 do Jabuti passou por duas mudanças no regulamento. A primeira foi a ampliação no número de categorias, que subiu de 21 para 29. Além disso, nesta edição, cada categoria teve apenas um vencedor – antes, as três publicações mais bem votadas eram premiadas.

  • Capa

Invisível – João Baptista da Costa Aguiar / Companhia das Letras

  • Ilustração

O Corvo – Manu Maltez / Editora Scipione

  • Ilustração de Livro Infantil ou Juvenil

Gildo – Silvana Rando / Brinque-Book Editora

  • Arquitetura e Urbanismo

Dois séculos de projetos no Estado de São Paulo – Grandes obras e urbanização VL 1, 2 e 3 – Nestor Goulart Reis e Monica Silveira Brito (colaboração) / Imprensa Oficial do Estado de São Paulo/ Edusp

  • Artes

Os Satyros – Germano Pereira / Imprensa Oficial do Estado de São Paulo

  • Biografia

Alceu Penna e as garotas do Brasil: moda e imprensa 1933 a 1975 – Gonçalo Júnior / Editora Amarilys

  • In Memoriam::

De menino a homem – de mais de trinta e de quarenta, de sessenta e mais anos – Gilberto Freyre /

Global Editora

  • Ciências Exatas

Teoria Quântica: estudos históricos e implicações culturais – Olival Freire Jr., Osvaldo Pessoa Jr., Joan Lisa Bromberg (orgs) / Editora Livraria da Física e EDUEPB

  • Ciências Humanas

Manejo do Mundo: conhecimentos e práticas dos povos indígenas do Rio Negro – Aloisio Cabalzar / Instituto Socioambiental

  • Ciências Naturais

Bioetanol de cana-de-açucar – P&D para produtividade e sustentabilidade – Luís Augusto Barbosa Cortez (coord.) / Editora Edgard Blücher e Fapesp

  • Ciências da Saúde

Atlas de endoscopia digestiva da SOBED – Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva – Marcelo Averbach / Editora Revinter

  • Contos e Crônicas

Desgracida – Dalton Trevisan / Record

  • Comunicação

Impresso no Brasil – Anibal Bragança e Marcia Abreu (orgs)/ Editora Unesp e Fundação Biblioteca Nacional

  • Didático e Paradidático

Coleção Pessoinhas – Ruth Rocha e Anna Flora / Editora FTD

  • Direito

Fundamentos constitucionais do direito ambiental brasileiro – Norma Sueli Padilha / Editora Elsevier

  • Economia, Administração e Negócios

Multinacionais brasileiras: internacionalização, inovação e estratégia global – Moacir de Miranda Oliveira Junior e Colaboradores / Bookman

  • Educação

Impactos da violência na escola: um diálogo com professores – Simone Gonçalves de Assis, Patrícia Constantino e Joviana Quintes Avanci (orgs) / Editora Fiocruz

  • Fotografia

Fotografia de Natureza – Luiz Claudio Marigo / Editora Europa

  • Gastronomia

Machado de Assis: Relíquias Culinárias – Rosa Belluzzo / Editora UNESP

  • Infantil

Obax – André Neves / Brinque-Book Editora

  • Juvenil

Antes de virar gigante e outras histórias – Marina Colasanti / Editora Ática

  • Poesia

Em alguma parte alguma – Ferreira Gullar / José Olympio

  • Psicologia e Psicanálise

Coração… É emoção: a influência das emoções sobre o coração – Elias Knobel, Ana Lúcia Martins da Silva, Paola Bruno de Araújo Andreoli / Editora Atheneu

  • Reportagem

1822 – Laurentino Gomes / Editora Nova Fronteira

  • Romance

Ribamar – José Castello / Bertrand Brasil

  • Tecnologia e Informática

Aprendizagem à distância – Fredric M. Litto / Imprensa Oficial do Estado de São Paulo

  • Teoria / Crítica Literária

Câmara Cascudo e Mário de Andrade – Cartas, 1924-1944 – Marcos Antonio de Moraes (org) / Global Editora

  • Turismo e Hotelaria

Hospitalidade – A inovação na gestão das organizações prestadoras de serviços – Geraldo Castelli / Editora Saraiva

  • Projeto Gráfico

Theodoro Sampaio – Nos sertões e nas cidades – Karyn Mathuiy / Versal Editores

  • Tradução

O livro de Dede Korkut – Marcos Syrayama de Pinto / Editora Globo

 

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